CONFLITOS
ASSIMÉTRICOS E O ESTADO: O Neoterrorismo e os Novos paradigmas para
formulação de Políticas de Defesa Nacional
RESUMO
Os atentados terroristas de 11 de
setembro de 2001 nos Estados Unidos da América e seus desdobramentos com a
chamada “Guerra ao Terror” marcam um novo cenário político e estratégico
mundial no campo do planejamento de Políticas de Defesa e Segurança dos
Estados. O modelo clássico de combate dos conflitos de Terceira Geração sede
cada vez mais espaço para os conflitos de Quarta Geração que são caracterizados
pelo caráter informal, dinâmico, flexível e mutável dos combates. Assim, forças
de combates irregulares, grupos terroristas, guerrilheiros, ações de
organizações criminosas e de narcotraficantes se multiplicam pelo mundo levando
sua mensagem de medo, terror e intolerância, fazendo um número cada vez maior
de vítimas em suas ações e em alguns casos, influenciado os processos
decisórios e políticos de nações, como no caso dos atentados de 11 de março de
2004 de Madri, na Espanha. Em tempos de globalização e de terrorismo sem
fronteiras e midiático, o planejamento de políticas de defesas focadas num
caráter defensivo e preventivo do Estado é sem duvida um dos maiores desafios
campo da política e das relações internacionais.
Palavras-Chaves: Conflitos Assimétricos, Estado, Políticas de Defesa
ASYMMETRICAL CONFLICT AND THE STATE: The Neoterrorismo and new paradigms for
the formulation of National Defense
Policy
ABSTRACT
The terrorist
attacks of September 11, 2001 in the United States of
America and its
consequences with the so-called "War on Terror" to mark the
political and global strategic
planning in the
field of Defence and Security Policy of the
States. The classic model for combating conflicts
of Third Generation
headquarters increasingly for Fourth Generation conflicts,
characterized by an
informal, dynamic, flexible and changeable
in combat. Thus, irregular
forces fighting terrorist
groups, guerrillas, actions
of criminal organizations have
multiplied throughout the world bringing
its message of
terror and intolerance,
causing an increasing number of victims and often
influenced the political paths of nations, as in the case
of the attacks of March 11, 2004 in Madrid. In times of
globalization and borderless
terrorism and media,
planning for defensive actions and defense of the
States are without doubt one of the
biggest challenges facing the field of international relations
Key Words: Asymmetric Conflict, State, Defense Policy
CONFLITOS
ASSIMÉTRICOS E O ESTADO: O Neoterrorismo e os Novos paradigmas para
formulação de Políticas de Defesa Nacional
Wando Dias
Miranda
Durbens
Martins Nascimento
"A coragem alimenta as guerras, mas é o medo que as faz
nascer."
( Émile-Auguste Chartier )
( Émile-Auguste Chartier )
Para Clausewitz, a guerra não
é arte nem ciência, ela é um fenômeno que pertence ao campo da existência
social, e que, dependendo das condições, pode tomar formas radicalmente
diferentes, modificando a sua natureza em cada caso, e se ajustando a um novo
padrão de conflito. Na mesma linha de pensamento, o general e filosofo chinês Sun Tzu, século IV a.C, em sua obra, a Arte da Guerra, aponta a
necessidade do emprego apropriado das forças de combate flexíveis e ágeis aos
diferentes tipos de terrenos, Forças Especiais1, capazes de
identificar os pontos frágeis do inimigo e minando sua resistência e vontade de
lutar, dessa maneira, produzindo vitórias incontestáveis de uma força de
combate inferior sobre uma superior, onde a utilização de estratégias de
combate irregulares, como as táticas de guerrilhas, venceram exércitos mais bem
equipados tecnologicamente e com maiores recursos. E assim foi ao longo da
história da humanidade, onde por muitas vezes, exércitos irregulares combatendo
com Exércitos regulares do Estado em lutas sangrentas pelo poder local de uma
região ou territórios. Podemos citar a ação dos Zelotes2 na
resistência aos romanos na antiguidade clássica durante a ocupação de
Jerusalém. Contemporaneamente, podemos mencionar a ação de grupos de partisans3 e maquis4 durante a guerra de
resistência aos exércitos alemães durante a Segunda Guerra Mundial (1939-1945)
na URSS e na França respectivamente, os movimentos de libertação nacional
pós-Segunda Guerra na África e na Ásia.
Atualmente, podemos analisar e
diferenciar os ataques terroristas feito por grupos como o IRA, ETA e o
Setembro Negro, que apresentam uma forma de ação clássica, dos ataques do Neoterrorismo5
promovidos por grupos como a Al-Quaeda,
Ansar al-Islam e Abu Sayyaf, o que nós leva a refletir como
os Estados podem se defender dessa nova modalidade de terrorismo que foge ao
padrão clássico e tem como uma de suas principais características no seu modus operandi, maximalizar o número de
vítimas civis em seus ataques.
Uma era de Insegurança
O mundo estar cada vez mais
globalizado e em rede, o que leva a um grande fluxo de mercadorias, serviços e
pessoas, em alguns casos, descontrolado e sem uma devida fiscalização dos Estados
de suas fronteiras, permitindo a entrada de agentes e organizações criminosos
em seu território, o que leva grandes riscos a sua população. Nesse cenário, os
sistemas de defesa nacionais devem estar preparados para essa nova realidade,
que surge tanto para além de suas fronteiras, como também dentro delas, procurando
desestabilizar suas estruturas sociais, política e econômicas, disseminando o
medo e terror dentro da sociedade. Soros (2007) aponta em seu livro A Era da
Insegurança, como uma das consequências da guerra contra o terrorismo
internacional, a intensificação das ação de máfias internacionais, de grupos terroristas
e do crime organizado e do mercado mundial de drogas e armas. Em uma época
marcada pela incerteza, a insegurança parece ser a única certeza no mundo.
Segundo
o Instituto Heidelberg6, em seu relatório anual sobre conflitos
mundiais, constatou que no ano de 2010, como mostra o gráfico 01, tivemos 363
conflitos espalhados pelo mundo, divididos entre conflitos de alta, média e
baixa intensidade, no ano de 2002 foram registrados 172 conflitos. Nesse mesmo
relatório, podemos constatar uma tendência mundial no aumento desses conflitos
ao redor do globo, motivados por vários interesses, sendo que a grande maioria
desses conflitos apresentam um padrão bem parecido, e podem ser classificados
como Conflitos Irregulares.
Segundo Visacro (2009), Conflitos Irregulares
são formas muito antigas de combate e são caracterizados por uma força que não
dispõe de organização militar formal e legal, nem equipamentos de grande porte
e logística específica, mas acima de tudo, não possuem autoridade jurídica,
institucional e legal, ou seja, é uma modelo de conflito levado por uma força
não regular, como os grupos terroristas, guerrilhas, insurreições, movimentos
de resistência, combates não convencionais. Assim, nesse tipo de beligerância,
não existe regras fixas que possam ser usadas como padrão para conceituá-los de
forma teorias, mas ao mesmo tempo, essa ausência de regras é uma das suas
principais características, pois lhe permite adequar-se e moldar-se aos mais
variados ambientes políticos, sociais e militares.
Em outro estudo realizado pelo SIPRI7
(Stockholm International Peace Research Institute) podemos observar no gráfico
02 um aumento dos gastos militares mundial como um todo, principalmente após os
atentados terroristas ao Estado Unidos da America pós 11 de setembro de 2001.
Entre os campeões de gastos militares são EUA, Rússia, Alemanha, França,
Inglaterra e China.
No
ano de 2000, segundo estudos do SIPRI, os EUA gastaram 377 bilhões de dólares
no seu setor militar e no ano de 2009, esse montante ultrapassou a soma de 663
bilhões de dólares, valores esse justificados pela sua guerra ao terror em
proporções mundiais com o custeio das campanhas militares no Iraque e
Afeganistão, além de operações encobertas e de inteligência pelo mundo, a China
investiu no ano de 2009 99 bilhões de dólares contra 31 bilhões no ano de 2000,
já a Inglaterra e a França gastaram em sua política de defesa a soma de 69 e 67
bilhões de dólares respectivamente. Grande parte desses gastos está relacionada
a atividades defensiva de defesa e reaparelhamento de suas forças de combates e
ações de inteligência e contra-inteligência.
Nesse
cenário, o Brasil no mesmo ano disponibilizou para o setor de defesa 51,3
bilhões de reais, sendo que o valor para investimento de 4,1 bilhões (8%) e de
6,7 bilhões para gastos de custeio (13,18%) e pessoal 38,8 bilhões (75,54%),
segundo dados do Ministério do Planejamento.
A Evolução do modo de lutar
A ilusão criada de um mundo mais pacífico Pós-Guerra Fria não se concretizou, e o mundo está cada dia mais armado e os conflitos tem se multiplicado. Assim como o poder de infligir danos materiais e mortes em um novo cenário de guerra sem fronteiras, onde os valores estratégicos das ações de grupos irregulares visam à desestabilização do Estado e a imposição pela força e pelo medo suas ideologias.
A ilusão criada de um mundo mais pacífico Pós-Guerra Fria não se concretizou, e o mundo está cada dia mais armado e os conflitos tem se multiplicado. Assim como o poder de infligir danos materiais e mortes em um novo cenário de guerra sem fronteiras, onde os valores estratégicos das ações de grupos irregulares visam à desestabilização do Estado e a imposição pela força e pelo medo suas ideologias.
É importante observar que os conflitos
de tipo irregular, fazem parte de um processo de evolução das guerras, que
segundo coronel Willian S. Lind (1989), especialista em estratégia militar,
podem ser divididos em quatro tipos, os conflitos de primeira, segunda,
terceira e quarta gerações. Sendo assim, os conflitos de primeira geração caracterizados
pela disposição das tropas de forma simétrica no campo de batalha, pelo emprego
de grande quantidade de homens e uma organização precisa das tropas, nesse tipo
de combate, a guerra é um monopólio do Estado e só pode ser conduzida por ele,
como exemplo desse tipo de guerra, podemos citar as guerras napoleônicas. Nos conflitos
de segunda geração temos a introdução da artilharia no campo de batalha que
prepara o avanço da infantaria, configurando-se pela máxima que diz “a
artilharia conquista, a infantaria ocupa”, padrão visto durante a Primeira
Guerra Mundial. A terceira geração é marcada pela utilização de bombardeiros
táticos e estratégicos e na utilização conjunta das forças armadas, tendo com exemplo
a Blitzkrieg8 (guerra
relâmpago) alemã durante a Segunda
Guerra Mundial. E por fim, nos conflitos de quarta geração temos o fim do
monopólio da conduta da guerra pelo Estado, os conflitos passam a ter várias
outras motivações, entre elas valores culturais, étnicos, religiosos ou
ideológicos, compondo um mosaico extremamente complexo de razões. Na verdade,
não é uma “evolução” dos conflitos, mas uma tendência ao se adaptarem a uma
nova realidade de combate baseada numa nova estrutura tecnológica e política.
Szu Tzu, em seus estudos sobre a
guerra, chama à atenção que durante a evolução do conflito, as técnicas e
estratégias utilizadas devem ser adequadas a realidade do combate, assim um
exército pequeno pode derrotar um grande exército, através da utilização de
confronto indiretos e evitando os confrontos diretos, utilizado as vantagens do
terreno e a surpresa contra seu oponente. No ano de 1999, dois generais
chineses, Qiao Liang e Wang Xiangsui, autores de Unrestricted Warfare - A Guerra sem Limites chamaram a atenção de
estrategistas e estudiosos do tema, para o uso maciço das novas tecnologias com
as antigas técnicas de guerrilha, como ferramentas do terrorismo em rede que
disseminam ataques cada vez mais violentos e inesperados como exemplo os ataques
terroristas de 11 de setembro. Nessa obra, muitos especialistas identificaram os
elementos centrais no modo de operação da Al-Qaeda,
mas que na prática já era empregada largamente pelos serviços secretos da CIA9
e da KGB10 nos tempos da Guerra do Vietnã e do Afeganistão.
O
general Prussiano Carl Von Clausewitz, na obra Da Guerra, traça uma série de
considerações sobre os fins e dos meios da guerra no capítulo II do primeiro
livro, nele, podemos constatar que para “desarmar um Estado” devemos observar três
fatores: as forças militares, o território e a vontade do
inimigo. Estes três fatores seriam os objetivos clássicos a enfrentar:
destruindo seu exército, para que não possa continuar a luta; conquistando seu
território, para que não se estruture um novo exército; e compelindo, pela
força, a cumprir com a sua vontade, porque o objetivo supremo é a captura moral do inimigo,
assim, as Guerras Irregulares tem um objetivo bem claro, que foge dos dois
primeiros fatores apontados por Clausewitz, mas está relacionado intimamente
com o terceiro, que é ataca a vontade de lutar do inimigo, e dessa forma,
desmoralizando-o em sua capacidade de atingir seus objetivos.
Os Conflitos Irregulares se apresentam como a face mais
latente desse novo tipo de guerra, uma vez que se utiliza “táticas
não-convencionais”, como ataques surpresas seguido de retirada rápida,
escaramuças, sabotagens, combates seletivos entre outras técnicas que tem por
objetivo surpreender os exércitos inimigos e a população civil, potencializando
assim uma sensação de terror e insegurança.
Outro ponto importante dos conflitos assimétricos, é que
em alguns casos, o agressor é o próprio Estado, que se utilizar de seu aparelho
militar e tecnológico para agredir grupos com poder de reação limitado ou sem poder.
Como o caso dos ataques preventivos realizados por tropas israelenses em
território palestino, o que muitas vezes, deixa um número grande de vítimas não
combatentes, e as ações norte-americanas no Iraque, baseadas na chamada
Doutrina Bush11 que lança mão do Hard
Power12 como elemento central de suas ações no cenário
internacional em detrimento do Soft Power13,
baseado em ações diplomáticas e de cooperações internacionais. Assim, para Joseph
S. Nye (2009) “os estados agem segundo seus interesses nacionais para garantir
sua segurança”, onde podemos entender o termo segurança de uma forma bastante
abrangente o que poderia levar a uma nova discursão, que não é o objetivo desse
trabalho, sobre o próprio conceito de soberania no campo das relações internacionais.
O Terrorismo Clássico e
o Neoterrorismo
O Terrorismo é um fenômeno social bastante antigo, onde
podemos encontrar os mais variados relatos de sua utilização ao longo da
história. Durante a República Romana era muito comum as chamadas guerras punitivas
contra grupos que se opunham a sua política, a destruição da cidade de Cartago,
serviu durante muito tempo de mensagem de terror para todos aqueles que se
levantassem contra Roma, a mensagem era clara, seriam exterminados da face da
terra, esse é um exemplo clássico de terrorismo de Estado na antiguidade. Mas
foi sem dúvida durante o século XVIII, no período de Revolução Francesa, que o
terrorismo se tornou um instrumento político-ideológico da revolução,
Robespierre e outros revolucionários acreditavam que o terror era um meio
justificável de destituir os que se opunham ao seu domínio.
O terrorismo como conhecemos hoje, possivelmente tem suas
origens no século XIX, quando Carlo Pisacane, revolucionário italiano, propôs
que o terrorismo poderia transmitir uma mensagem para um público especifico, ao
chamar atenção para sua causa e tentar conquistar apoio. Esse tipo de terrorismo
tinha muito mais uma causa ideológica e teve sua fase mais intensa durante o processo
de descolonização européia Pós-segunda Guerra Mundial e durante a Guerra Fria.
No Brasil, nos anos de 1960 e início da década de 1970, as técnicas de
terrorismo foram sistematizadamente utilizadas durante a guerrilha urbana
contra o Regime Militar (1964-1985). Carlos Marighella (1969) em seu Manual do
Guerrilheiro Urbano sistematizou as varias técnicas terroristas, desde ações de
infiltração, sequestros e assaltos a bancos, além do uso de inteligência na
obtenção de informações e de contra-inteligência.
O terrorismo clássico apresenta como suas principais
características ser eminentemente local, secular, de motivação política,
ideológica e nacionalista e focada na autodeterminação, apresentando uma
estrutura fixa em um determinado país hospedeiro e com uma hierarquia rígida e
organizada, as autorias dos atentados, normalmente, eram reivindicadas de
imediato e suas ações utilizavam armamentos portáteis e explosivos com poder de
destruição limitado, tendo seus alvos específicos autoridades políticas e
militares, essa modalidade de terrorismo apresentado uma preocupação com a
opinião pública buscando apoio para sua causa, destacamos aqui a ação do IRA,
ETA, Frente de Libertação da Palestina, Brigadas Vermelhas Italianas, Sendero Luninoso, entre outros.
O Neoterrorismo possui um modo operacional diferente do
terrorismo clássico, para Da Silva (2009) “o neoterrorismo não tem campo de
batalha, é de massa, espetacular, midiático e se utilizar de bombas múltiplas”.
Assim o novo terrorismo é globalizado, apresentando um radicalismo religioso em
seus discursos, apresentando uma estrutura de operação móvel, organizada em
redes espalhadas pelo mundo onde ocorre a proliferação de inúmeras novas
organizações, a maioria desconhecida, as autorias dos atentados não são
prontamente assumidas e suas ações utilizam normalmente agentes suicidas, com
explosivos com grande poder de destruição, além de uma quantidade de armamentos
e explosivos variados, seus atentados são organizados para fazer um grande
número de vítimas e buscam uma ampla divulgação pelos meios de comunicação. No
mundo atualmente existe um grande medo que essas organizações, muitas vezes
invisíveis as agencias de segurança do Estado, possam ter acesso a armamento
químico, biológico e nuclear (AQBN), o que poderia maximizar seu poder de
destruição e discriminação do medo na sociedade.
Os conflitos irregulares urbanos.
Nos grandes centros urbanos, temos o aparecimento de novos
atores que se utiliza do terror para impor suas vontades, o crime organizado se
estrutura como um câncer em alguns países, a máfia russa, a chinesa, os cartéis
internacionais de drogas e as grandes organizações criminosas como os Zetas no México e o Primeiro Comando da
Capital - PCC e Comando Vermelho - CV no Brasil, são exemplos de um poder que
hoje não é mais paralelo em relação à estrutura de poder do Estado, mas podem
até se torna transversal ao poder oficial, uma vez que agentes dessas
organizações se infiltram dentro das esferas do poder para operacionar o
sistema em beneficio próprio, e isso ocorre, em grande parte dos casos, devido
aos elevados índices de corrupção dos operadores do sistema.
No Brasil, o crime organizado já demostrou seu poder de
aterrorizar a população em vários momentos, em 2006, ações empreitadas por
facções criminosas promoveram vários ataques incendiários a ônibus e atentados
e execuções de vários agentes do sistema de segurança pública, os atentados se
dirigiam principalmente a polícias militares e agentes do sistema prisional no
ano de 2006, que deixou 18 mortos e mais de 20 feridos. No Rio de Janeiro, em
2009, traficantes do Morro dos Macacos, zona norte Rio, abateram um helicóptero
da Polícia Militar. Ações como essas e tantas outras demostram o poder bélico
dessas organizações e sua estrutura organizacional para enfrentar o Estado.
Os números dessa guerra civil entre o Estado e as
organizações criminosas são espantosos, segundo o relatório “Estado das Cidades
do Mundo 2004/2005” do Programa de Assentamento Humano da Organização das
Nações Unidas (ONU – Habitat), mostrou que cresceu a criminalidade no Brasil,
apontando os Estados do Rio de Janeiro, São Paulo, Espirito Santo e Pernambuco
com os mais violentos do país. O relatório atribui esse aumento da violência à
ação do crime organizado, ao tráfico de drogas e armas, além da ausência do
Estado nos setores estratégicos (Saúde, Educação, Segurança, Lazer e Trabalho)
da sociedade para impedir a entrada de jovens no circuito do crime.
Para Visacro (2009), a questão da violência urbana no
Brasil é algo bem mais complexo, decorrente da interação de um conjunto de
fatores de diferentes ordens que não podem ser trabalhados de forma isolada. A
ação desses grupos criminosos profissionais é feita através de um planejamento
operacional quase que militar, onde suas táticas de ações se assemelham em
muitos casos a ações de grupos guerrilheiros, pelo seu poder bélico, sua
ferocidade nas ações e objetividade, além é claro, de um eficiente sistema de
segurança orgânica que dificulta em alguns casos, a identificação de suas
lideranças e o papel de cada integrante das organizações e suas redes de
contatos.
Ações Defensivas
do Estado
O processo de elaboração de Políticas de Defesas dos
Estados hoje é sem dúvida um dos maiores desafios de nossa época, pois como
criar políticas de combate e ações defensivas e preventivas contra um inimigo que
não possui um rosto conhecido e nem uma bandeira ou território para defender, e
que por vezes, pode se infiltra dentro do Estado para obtém vantagens tanto de
valor operacional, informações e de ações táticas que acabam por favorecer suas
ações?
A necessidade crescente do desenvolvimento de métodos
para o combate dessas novas ameaças baseadas em conceitos de flexibilidade,
agilidade e inteligência no planejamento das ações pode ser um dos caminhos a
seguir pelos Estados para proteger sua população. Assim, o treinamento e a
utilizações de Forças Especiais aparecem como uma alternativa no modelo de
preparo dos exércitos modernos. Ações de grupos terroristas, guerrilha,
insurgente, narcoterroristas e crime organizado necessitam de uma nova estratégia
que foge dos padrões militares formais dos exércitos ou das forças auxiliares
(no caso do crime organizado e das guerrilhas urbanas nos grandes centros). O
uso de sistemas de inteligências, redes de atuações a prevenção do Estado que
atendam as comunidades carentes e o aprimoramento dos códigos de leis são
ferramentas indispensáveis, e devem ser utilizadas pelos governos durante a
elaboração de suas Políticas de Defesa e Segurança.
Para Pinheiro (2004) o aspecto essencial mais ratificado
no conflito de quarta geração é que o uso da Inteligência militar e
governamental são as chaves para o sucesso de qualquer campanha contra as
forças irregulares. Hoje, mais do que em nenhum momento histórico, as operações
de inteligência e
contra-inteligência orientam as ações estratégicas e táticas dos Estados no
sentindo de prevenir as ações desses grupos, mas somente essas atividades não
são suficientes para combater essa modalidade de conflito, é necessária também
a cooperação internacional através de suas várias agências internacionais na
tentativa de fechar o fluxo de dinheiro que corre de forma irregular e alimenta
ações terroristas e do crime organizado pelo mundo. Políticas de Estados para a Segurança e
Defesa devem ser pensadas de forma ampla buscando dinamizar suas ações de
caráter preventivo e ao mesmo tempo salvaguarda sua população de processos de
aliciamento dessas organizações. O crime organizado nos grandes centros
urbanos, os movimento de guerrilha principalmente nas áreas de fronteira e a
ação de grupos terroristas são desafios da nova ordem de poder mundial. Onde os
Estados devem estar preparados para enfrenta-las com a certeza que não será um
conflito rápido e decisivo, mas lento e dolorido.
Notas
1 São denominadas Forças
Especiais, as unidades militares treinadas para a guerra irregular.
Tende a se nomear os militares formados em cursos de forças especiais como operante
ou operador, tendo em vista que estão capacitados a realizar operações
especiais.
2 O
termo Zelote estar relacionado ao movimento
político judaico do século I que procurava incitar o povo da Judeia a
rebelar-se contra o Império Romano e expulsar os romanos pela força das armas,
que conduziu à Primeira Guerra Judaico-Romana (66-70 d.C).
3 Os
Partisos são os soldados
irregulares do exército vermelho que lutavam na retaguarda do Exército
soviéticos. Atuavam em guerra de guerrilha e na caça dos inimigos dentro das
linhas do Exército Vermelho. uma variação desse tipo de combate.
4 O
termo Maquis estar relacionado a organização dos soldados da resistência
francesa que aplicavam técnicas de guerrilha e atuavam nas áreas rurais do país
durante a Segunda Guerra Mundial, agindo em sabotagens, ações de inteligência,
assassinatos e combates indiretos.
5
Denomina-se por Neoterrorismo a nova fase do terrorismo internacional,
posterior aos ataques terroristas aos Estados Unidos em 11 de setembro de 2001,
é caracterizado pela emergência de organizações, grupos e redes não-estatais
que por meio de ações violentas premeditadas, direcionados contra alvos
não-combatentes, com o uso da mídia como um meio para potencializar a sensação
de terror na população e a utilização de armamento não convencional, como
aviões, barcos e mulheres bombas em algumas ações.
6 O Heidelberg Institute for International
Conflict Research publica anualmente o relatório Conflict Barometer, onde faz um levantamento dos conflitos
mundiais, dividindo-os em três categorias: Alta, Média e Baixa Intensidade, os
relatórios podem ser acessados no site: http://www.hiik.de/en/konfliktbarometer.
7 O
SIPRI (Stockholm International Peace
Research Institute) é uma organização sueca que se dedica a fazer estudos
sobre os gastos militares mundiais, e suas publicações podem ser acessadas no
site: http://www.sipri.org.
8 O Blitzkrieg
(termo alemão para guerra-relâmpago)
foi uma doutrina militar a nível operacional que consistia em utilizar forças
móveis em ataques rápidos e de surpresa, com o intuito de evitar que as forças
inimigas tivessem tempo de organizar a defesa. Seus três elementos essenciais
eram a o efeito surpresa, a rapidez da manobra e a brutalidade do ataque, e seus
objetivos principais eram: a desmoralização do inimigo e a desorganização de
suas forças (paralisando seus centros de controle). O arquiteto desta
estratégia militar foi o general Erich von Manstein.
9 A Agência Central de Inteligência (CIA)
é uma agência de inteligência civil do governo dos Estados Unidos responsável
por fornecer informações de segurança nacional para os políticos seniores dos
Estados Unidos. A CIA também se engaja em atividades secretas fora do solo
americano, sendo proibida de agir dentro do seu território. A agência foi
criada em 1947 pelo presidente Harry S. Truman (1884-1972) mediante um pacto
governamental de Segurança Nacional para satisfazer uma necessidade estratégica
devido ao início da Guerra Fria e ao avanço do comunismo.
10 KGB (Komityet gosudarstvennoy bezopasnosty; em português, Comité de Segurança do Estado) era o
nome da principal agência de informação e segurança (serviços secretos) da
antiga União Soviética,
que desempenhava em simultâneo as funções de polícia secreta do governo
soviético, entre 13 de Março de 1954
e 6 de Novembro de 1991.
O domínio de atuação do KGB, durante a Guerra Fria, pode ser comparado, nos Estados Unidos,
à combinação dos serviços secretos da CIA e
da segurança interna do FBI. Depois da implosão da URSS, o maior
sucessor do KGB é o Serviço Federal de Segurança da Federação Russa (FSB).
Também o nome oficial do serviço de inteligência da Bielorrússia, a Agência de Segurança do Estado, permanece como
KGB.
11 A Doutrina Bush
é um termo utilizado para descrever uma série de princípios relacionados com a
política externa dos Estados Unidos da America durante a gestão do presidente
George W. Bush, ela é resultado direto dos atentados de 11 de setembro de 2001.
A frase inicialmente descrita na política que os EUA tinham o direito de tratar
como terroristas os países que abrigam ou dão apoio aos grupos terroristas, que
foi utilizado para justificar a invasão do Afeganistão e do Iraque. Mais tarde,
ele incluiu elementos adicionais, tais como a controversa política de guerra
preventiva, que dar aos EUA a legitimidade de depor regimes estrangeiros que
representam uma suposta ameaça à segurança dos Estados Unidos, mesmo que esta
ameaça não seja imediata.
12 Hard power (do inglês poder duro) é um conceito que é
principalmente usado no realismo das relações internacionais e se refere ao
poder nacional que vem de meios militares e econômicos.
13 Soft power (do inglês poder suave) é um termo usado na
teoria de relações
internacionais para descrever a habilidade de um corpo político, como um Estado, para influenciar indiretamente o comportamento ou
interesses de outros corpos políticos por meios culturais ou ideológicos. O termo foi usado pela primeira vez
pelo professor de Harvard Joseph Nye. Ele desenvolveu o conceito
em seu livro de 2004, Soft Power: The Means to Success in World Politics
(Soft Power: Os Meios para o Sucesso na Política Mundial). Embora sua utilidade
como uma teoria descritiva foi desafiada, soft power entrou desde então em
discursos políticos como uma maneira diferente de distinguir os efeitos sutis
de culturas, valores e ideias no comportamento de outros. Nas palavras de Nye,
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