quarta-feira, 25 de janeiro de 2012

Obama faz alerta ao Irã e propõe aumentar imposto dos mais ricos

Durante discurso tradicional nos EUA, presidente também ataca pontos fracos de sua administração

WASHINGTON - Em seu terceiro discurso sobre o Estado da União, na noite de terça-feira, o presidente dos Estados Unidos, Barack Obama, teve o cuidado de não declarar a vitória americana no Iraque nem de reforçar seu plano de retirada de tropas do Afeganistão até o final de 2014. Cauteloso, celebrou a Primavera em países árabes, mas sublinhou sua "incerteza" de como "essa incrível transformação terminará".
Em tom mais acertivo, estampou a continuidade da guerra contra o terrorismo "do Paquistão ao Iêmen", um possível conflito militar dos EUA contra o "isolado" Irã e a inevitável derrubada de Bashar al-Assad, presidente da Síria. "O regime (iraniano) está mais isolado que nunca; seus líderes enfrentam sanções devastadoras e, enquanto eles não assumirem suas responsabilidades, essas pressões não reduzirão", afirmou, ao elogiar os esforços da diplomacia americana. "Não vou deixar dúvidas: a América está determinada a evitar que o Irã tenha arma nuclear, e eu não vou tirar as opções da mesa para alcançar esse objetivo", completou Obama, para em seguida salientar sua preferência por uma "solução pacífica".
Ao tratar a guerra contra o terrorismo, tema presente em todos os discursos sobre o Estado da União desde 2001, Obama valeu-se de seu principal troféu como exemplo de sucesso de sua política nessa área. mostrou-se ainda mais cauteloso. A morte de Osama Bin Laden, líder da Al-Qaeda, por um comando especial das Forças Armadas americanas em maio passado ocupou logo o segundo parágrafo de seu discurso, logo depois de suas bas vindas às tropas regressadas do Iraque. "Pela primeira vez em nove anos, não há Americanos lutando no Iraque. Pela primeira vez em duas décadas, Osama Bin Laden não é uma ameaça para este país".
Obama ressaltou sua versão de que os militantes remanescentes da Al-Qaeda estão "cambaleantes", sem ter como escapar da perseguição dos Estados Unidos. Mas, logo depois de ter ressaltado o retorno de 10 mil soldados americanos do Afeganistão, em dezembro passado, e de outros 23 mil até meados deste ano, esquivou-se de reiterar seu plano de finalizar essa guerra até o final de 2014, anunciado no ano passado. No segundo semestre deste ano, ainda restarão cerca de 70 mil soldados americanos no Afeganistão. Obama visivelmente preferiu adotar no discurso o tom mais cauteloso sugerido por seus conselheiros militares.
"A transição para a liderança afegã continuará, e vamos construir uma duradoura parceria com o Afeganistão, para (esse país) nunca mais tornar-se fonte de ataque contra a América", declarou. Diante das notícias de acirramento dos ataques de tropas oficiais aos oponentes do governo sírio, Obama afirmou estar certo de que "o regime de Al-Assad vai descobrir em breve que as forças da mudança são irreversíveis e que a dignidade humana não pode ser negada". Ilustrou essa certeza com a queda do ex-líder líbio Muamar Kadhafi, no ano passado. E, nas entrelinhas, resumiu sua certeza da derrubada do regime de Damasco.
Ao mencionar as incertezas sobre o rumo da Primavera nos países árabes, Obama teve o cuidado de prometer o apoio dos EUA a políticas em favor da democracia, dos direitos humanos e dos mercados livres. "Vamos ficar ao lado dos direitos e da dignidade de todos os seres humanos - homens e mulheres; cristãos, muçulmanos e judeus", afirmou. Em uma espécie de interlúdio, para conciliar e afagar a platéia de democratas e republicanos, Obama defendeu ser indiscutível a liderança americana no mundo. Essa condição estaria expressa, segundo ele, no compromisso dos EUA com a segurança de Israel, nas coalizões para assegurar o uso de material nuclear, nas missões de combate à fome e a doenças.
"Do golpe que demos nos nossos inimigos ao poder duradouro do nosso exemplo moral, a América está de volta", declarou, entre aplausos. "Qualquer um que diga o contrário, que diga que a América está em declínio ou que nossa influência está diminuindo, não sabe do que está falando. A América continua a ser a Nação indispensável nos assuntos mundiais. Enquanto eu for presidente, pretendo manter assim."
Impostos. Com a reeleição como maior desafio em 2012, o presidente dos Estados Unidos, Barack Obama, confrontou a maioria republicana no Congresso com uma agenda econômica desenhada na medida para agradar o eleitorado democrata. Sua posição foi expressa em detalhes ao longo de seu discurso de uma hora de duração sobre o Estado da União, na noite de terça-feira. Obama defendeu o aumento de impostos sobre contribuintes mais ricos e a concessão de incentivos fiscais para os setores manufatureiro e de energia limpa. Ambas as iniciativas já foram obstruídas pelos republicanos, detentores de maioria na Câmara dos Deputados.
No plenário do Congresso, aplaudido efusivamente, o presidente americano convocou a oposição a trabalhar junto com o governo nessa agenda. Porém, já certo da recusa, orientou o texto do discurso para uma fácil diferenciação, pelo eleitor, entre sua receita para a recuperação econômica e a dos pré-candidatos republicanos. Obama valeu-se de pessoas comuns como exemplos dos que se beneficiarão – todas trazidas para o balcão da primeira-dama, Michele Obama – e resumiu suas mensagens em slogans fáceis de serem lembrados e repetidos.
O título dado ao discurso foi “Uma América Construída para Durar”, frase que sintetizou sua mensagem em favor de uma melhor distribuição das responsabilidades dos americanos. Ou seja, da maior coleta de impostos dos mais abastados. “O retorno para os valores americanos do jogo limpo e da responsabilidade compartilhada ajudará a proteger nosso povo e nossa economia. Mas deve também nos guiar ao olharmos a redução da dívida pública e o investimento no nosso future”, declarou.
Obama defendeu novamente a receita dada pelo bilionário Warren Buffett, seu aliado, para essa reforma tributária. Contribuintes com renda anual superior a US$ 1 milhão não deve pagar menos de 30%. Aqueles com renda de até US$ 250 mil ao ano, não sofreriam aumento de tributo. Desde 2006, os contribuintes com renda superior a US$ 370 mil ao ano são beneficiados com redução no Imposto de Renda. Obama tentou, sem sucesso, derrubar três vezes essa medida no Congresso.
“Vocês podem chamar isso de luta de classes”, afirmou, dirigindo-se aos republicanos. “Mas, fazer um milionário pagar mais imposto que sua secretária? Muitos americanos chamariam isso de bom senso”, argumentou. Basicamente, Obama defendeu mais três grandes tópicos, além da reforma tributária: a necessidade de maior regulação sobre o sistema financeiro, uma nova política industrial e a solução para a crise no setor de financiamento de habitação, o epicentro da crise de 2008. O presidente americano não chegou a mencionar os riscos para a economia do país do agravamento da crise da dívida soberana na Europa.
Dívida imobiliária. Entre as poucas iniciativas inéditas do governo de Obama conhecidas nesse discurso estão a criação de unidade especial de procuradores federais para investigar o processo de concessão abusivo de empréstimos habitacionais, que levou à crise de 2008, e o envio ao Congresso de um plano para aliviar os detentores de hipotecas. Essa última proposta permitiria ao hipotecário que conbcorde em renegociar sua dívida a taxas mais baixas uma economia de US$ 3.000 ano ano, segundo Obama. Esse projeto também daria aos bancos chance de pagar aos contribuintes pelo pacote de socorro que receberam do governo no auge da crise.
“Não nos esqueçamos nunca: milhões de americanos que trabalham duro e conforme as regras todos os dias merecem um governo e um sistema financeiro que façam o mesmo”, afirmou. “É hora de aplicar as mesmas regras de cima para baixo: não aos resgates, não às benesses, não aos subterfúgios. Uma América construída para durar insiste na responsabilidade de todos”, completou.
Regulação Financeira. Obama rebateu os ataques da oposição republicana e de seus pré-candidatos à Casa Branca por ter apoiado e adotado a Lei Dodd-Frank, primeira iniciativa consistente dos EUA para a regulação de seu setor financeiro. Conforme defendeu, uma regulação inteligente não limita o livre mercado. “Ela faz o livre mercado funcionar melhor”, defendeu. “Nós colocamos em prática novas regras para manter Wall Street dentro de suas responsabilidades, para que a crise (de 2008) nunca se repita de novo”.
Política Industrial. As medidas defendidas por Obama no discurso sobre o Estado da União poderão significar aumento de gastos públicos – um alvo de inevitável ataque dos republicanos. Mas, conforme insistiu o presidente americano, certamente resultarão em novos empregos e no retorno dos postos de trabalho transferidos para o exterior. Mais emprego, neste ano, também significará melhor condição de reeleição do Obama. Nenhum presidente americano conseguiu se reeleger com um ambiente econômico marcado por uma taxa de desemprego de 8,5%, a registrada em dezembro passado.
A maioria das medidas de política industrial sugeridas por Obama depende de aprovação no Congresso. Ele defendeu a adoção de xxx iniciativas. Primeiro, a concessão de incentivos fiscais para empresas que tragam suas plantas e empregos, hoje no exterior, de volta aos EUA. Segundo, o aumento de impostos para multinacionais americanas que gerem empregos no exterior. Terceiro, a duplicação dos incentivos fiscais para empresas de alta tecnologia que mantenham suas instalações nos EUA.
“Minha mensagem é simples. Chegou a hora de parar de recompensar as empresas que enviam nossos empregos para o exterior e de começar a premiar as companhias que criam empregos aqui na América”, afirmou, ao desafiar o Congresso a aprovar uma lei nesse sentido. Como quarta iniciativa, Obama defendeu a negociacão de novos acordos bilaterais de livre comércio e o combate a práticas desleais nas trocas internacionais – um recado claro para a China, usada por ele como exemplo. Conforme adiantou, seu governo criará uma espécie de unidade policial de comércio para investigar as práticas desleais, o contrabando e a segurança dos produtos. Chegou mesmo a se dispor a trabalhar no velho estilo do caixeiro-viajante. “Vou a qualquer lugar para abrir mercados para os produtos americanos”, afirmou.
A quinta medida sugerida por ele foi a redução de impostos para pequenas e médias empresas investidoras em inovação. “Precisamos dar apoio a qualquer um que queira trabalhar e para qualquer empresário que aspire tornar-se o próximo Steve Jobs”, insistiu, referindo-se ao fundador da Apple, falecido no ano passado. A sexta iniciativa, também nas mãos do Congresso, foi a prorrogação da redução do imposto sobre a folha de pagamentos das empresas e sobre a renda dos trabalhadores de classe média a partir de fevereiro.
Como sétimo ponto, Obama defendeu o incentivo do governo federal ao setor de energia limpa, incluindo o gás natural, e o fim de subsídios para as companhias petroleiras. Também sugeriu a concessão de ajuda federal para indústrias que economizarem energia elétrica. Conforme argumentou, a parceria do governo com o setor privado fez dos EUA o líder na produção de baterias de alta tecnologia no mundo. “Por causa de investimentos federais, o uso de energia renovável dobrou, e milhares de americanos têm empregos.”
No oitavo tópico, em suas mãos, Obama prometeu assinar um decreto para acabar com as limitações ao investimento federal em infraestrutura. Ele lembrou ter os EUA injetado dinheiro no setor de construção de grandes projetos em momentos difíceis, como a Grande Depressão, nos anos 30. “Pegue o dinheiro que não vamos mais usar com a guerra, use a metade para pagar nossa dívida e o restante para fazer aqui nos Estados Unidos a construção de Nacão”, afirmou, valendo-se do termo aplicado para a política americana de reconstrução de países afetados por guerras.
A Educação, como meio de prover mão-de-obra mais qualificada para os novos desafios produtivos do país, fez parte do nono ponto da política industrial de Obama. Ele pediu ao Congresso que impeça o aumento de 100% na taxa de juros sobre o crédito estudantil, e aos Estados, que mantenham estudantes no ensino secundário até a formatura ou até completarem 18 anos.
Ciente da dificuldade de ser aprovado neste ano eleitoral a reforma da imigração – sua promessa da campanha de 2008 -, Obama apelou para os parlamentares aprovarem uma lei que autorize a permanência dos filhos de imigrantes indocumentados no país, com permissão para estudar nas universidades e/ou abrir negócios, e também de estrangeiros graduados nos EUA. O Congresso já rejeitou, anteriormente, as mesmas iniciativas.

Fonte: O Estadão

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