O governo argentino promulgou na quarta-feira uma polêmica lei que permite qualificar como "terrorismo" atos como uma manifestação ou uma corrida cambial. A norma, aprovada na semana passada pelo Congresso com apoio da maioria governista, foi criticada por juristas, que a consideram inconstitucional devido à sua definição ampla demais sobre o que é terrorismo.
A lei prevê até 15 anos de prisão para quem "aterrorizar" a população ou obrigar o Estado a se eximir de suas obrigações. "O problema é a ambiguidade da expressão 'terrorismo'. Poder-se-ia (considerar terrorista) um protesto social ou o título de um jornal (...). Uma corrida bancária poderia ser considerada um ato de terrorismo", disse à Reuters o advogado constitucionalista Félix Lon.
O governo justificou a medida pela necessidade de adaptar a legislação local a normas antiterroristas internacionais, como exige o Grupo de Ação Financeira Internacional (Gafi), que mantém a Argentina sob observação devido a falhas no combate à lavagem de dinheiro. Mas o diretor da Unidade de Informação Financeira (UIF), José Sbatella, afirmou recentemente que a lei tem como alvo os "golpes de mercado", e visa a evitar que "um grupo de pessoas de grande poder econômico possa definir uma política ou que esvazie as reservas e aterrorize a população de tal maneira que a induza a esvaziar os depósitos".
A presidente Cristina Fernández de Kirchner tomou posse neste mês para um segundo mandato prometendo aprofundar as políticas de intervencionismo estatal, que agradam à opinião pública local, mas afastam investidores. Dias depois de ser reeleita, em outubro, a presidente impôs controles cambiais para frear uma fuga de capitais que erodiu as reservas do Banco Central e provocou uma redução dos depósitos em dólares nos bancos.
Cristina já assegurou em diversas ocasiões que especuladores financeiros querem desestabilizar seu governo. Juristas concordam que a nova lei pode provocar uma avalanche de liminares judiciais que acabe inviabilizando sua aplicação até que a Corte Suprema se pronuncie sobre sua constitucionalidade.
"Aqui estamos diante de uma tipificação penal aberta, que abarca todo o espectro de delitos do código penal argentino, o que me parece um disparate. Nunca poderá ser aplicada", disse o constitucionalista Eduardo Barcesat. A lei antiterrorista também foi criticada por entidades de direitos humanos aliadas do governo, e pelo juiz Eugenio Zaffaroni, da Suprema Corte, muito ligado a Cristina.
"O Gafi é um organismo que se arvora em atribuições que não tem, e extorque nosso país. Seu objetivo não é evitar a lavagem nem prevenir o terrorismo, e sim controlar todo o movimento financeiro", disse o juiz a meios de comunicação locais. Já Estela de Carlotto, presidente da entidade Avós da Praça de Maio, se disse "preocupada" com a possibilidade de que a nova lei criminalize movimentos sociais.
Fonte: Reuters
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